“É necessário ter o caos aqui dentro para gerar uma estrela”.
NIETZSCHE
O Mundo atual que se constituiu à nossa volta, apresenta-se como um espaço e um tempo do hiperterrorismo, das hiperpotências, das hiperclasses, do hipertexto, da hiperinformação, do hipermercado, do hiperconsumo, do hipercapitalismo enfim, da hiperabundância de todas as coisas criadas pelo homem a partir das revoluções filosófica e científica na modernidade.
Contudo, apesar de se situar no núcleo deste frenesi do hipercapitalismo, os homens e mulheres hipermodernos encontram-se na mais profunda individualidade que a história jamais pode ver: situam-se em um vazio profundo de significações e significados que os fadam ao individualismo, à solidão e ao desespero do excesso. Como diz Lipovetsky, o homem hipermoderno está fragilizado pelo medo em uma era de exageros.
Em meio a esta lógica da hiperabundância os indivíduos hipermodernos vêem-se bombardeados por uma infinidade de informações, serviços e objetos que os tornam ilimitados em seus desejos. A lógica do ter (coisas, informações e serviços) sobressai-se em relação à lógica do ser (do tornar-se ético, moral, honesto, honrado, por exemplo) o que demarca a fragilidade de sua existência diante do mundo hipercapitalizado.

Este fenômeno, o hiperindividualismo, pode ser entendido ao se analisar a invasão das novas tecnologias da informação no seio da família, da escola e das instituições organizadoras da sociedade. Pois os telefones celulares, os computadores, os nootbook’s, os aparelhos de CD/DVD, as televisões de plasma, a internet, os Ipod’s, os modems móveis G3 e toda sorte de tecnologias ressignificam o espaço e tempo dos indivíduos na atualidade.
Assim, o contato dos hiperindivíduos com as novas tecnologias da informação promove o uso do tempo e espaço de forma diferenciada, sem padrões ou modelos a seguir. Qualquer pessoa pode tornar-se escritor, cineasta, crítico de cinema ou design com alguns cliques na internet. Ou seja, para o hiperindivíduo tornar-se expert em alguma coisa depende de seu desejo em conhecer algo, do seu reinventar-se e de sua possibilidade criativa. Além deste efeito, as tecnologias da informação, permitem aos indivíduos fazerem uso de seu espaço e tempo de forma individualizada. Pois a internet, por exemplo, permite se estabelecer contatos com outros indivíduos, mundo afora, e no momento que se quiser, na clausura do seu quarto.
Neste contexto, o hipermundo tornar-se um espaço e tempo sem ideologias, sem fronteiras, sem regras, sem limites, uma sociedade do hiperconsumo e, talvez como alguns pessimistas diriam, uma sociedade caótica. Mas Lipovetsky não concorda com os pessimistas e ratifica a hipermodernidade pois (...) por toda parte há uma sociedade dos livres serviços que se acentuou (...) devido à sociedade de consumo e agora mais ainda pelas novas tecnologias. Sociedade esta que se moderniza a cada instante em função de sua inventividade e criatividade.
Ora diante deste hiperdindiviualismo da sociedade hipermoderna, sociedade esta sem limites, afeita ao frenisi das novas tecnologias e à impulsividade do consumo instantâneo de informações imediatistas, de coisas efêmeras e de momentos de pura individualidade solitária, qual seria a possibilidade do filosofar e da educabilidade uma vez que filosofar e educar exige regras, limites, valores e conhecimentos que foram passados de geração em geração? Ou de outra forma, como se poderá filosofar e se educar em uma sociedade em que os valores e os conhecimentos que foram passados de geração em geração são substituídos por valores individualizados que satisfaçam as exigências do consumo desenfreado, da efemeridade e da hiperabundância? Enfim, quais caminhos percorrer para a efetivação de um pensamento filosófico e de uma educação democrática e de qualidade na hipermodernidade diante do hiperindividualismo e do hiperconsumismo ou diante da ditadura da marca nos tempos atuais?
A este respeito Lipovetsky apontará um paradoxo da hiperindividualidade. Pois os homens e as mulheres, mesmo afeitos à liberdade hipermoderna continuam tendo um certo autolimite e um número de parceiros sexuais limitado. Isso é interessante. De um lado, parece que tudo é possível, tudo é permitido e não é bem assim. Apesar dos indivíduos estarem voltados para o imediatismo do presente com o consumo associado a uma ética da felicidade (quanto mais consumir mais feliz será) que bombardeia, de um lado, o hiperindivíduo com uma loucura gerada por liquidações, lançamentos, datas festivas e, em contraponto, uma obsessão pela saúde em um comportamento crescente de preocupação com o corpo, cuidados com a alimentação, priorizando produtos saudáveis e de qualidade, muitos hiperindivíduos se mantém em uma posição de moderação e uma espécie de reequilíbrio.


Portanto, filosofar e educar no mundo hipermoderno é lembrar que mesmo dentro da hiperabundância de saberes, valores, técnicas há sempre uma necessidade individual em relembrar o já dito, manter-se em determinados valores e experimentar toda sorte de técnicas que o ser humano é capaz. Ao invés de se moralizar o hipermundo com valores de conduta e nivelamento, com posicionamentos intelectuais tradicionalmente aceitos por décadas passadas e, sobretudo, promover a profanação da técnica em favor de padrões ideológicos impostos por profetas da sociedade, tem-se que valorizar a informação, a diferença, a individualidade, a abundância, a ética, a técnica e toda sorte de possibilidades da hipermodernidade. Pois de um simples e corriqueiro objeto tecnológico presente em todos os lares mundo afora, a televisão, pode-se escravizar os hiperindivíduos do mundo inteiro com valores de condutas e ideologias dominantes. Mas também se pode extrair deste equipamento informações importantes que farão os hierindivíduos tornarem-se mais críticos, reflexivos e criativos.
A filosofia e a escola que queremos proporão que a hipermodernidade aconteça em um ambiente escolar repleto do hipermundo que integra o hiperindivíduo. Este novo modo de pensar a realidade e produzir conhecimentos na escola tem que se tornar um fenômeno de hiperconsumo, com todas as informaçãoes que estiverem contidas e ao alcance dos hiperindivíduos. A escola que queremos é a hiperescola. Como dirá Lipovetsky a escola da paixão em que o hiperindivíduo se torne o hiperprotagonista e o hiperator da reinvenção e recriação de um novo espaço e tempo na história humana. Pois educar é proporcionar à história da humanidade que haja novos atores históricos (...) em um universo aberto. E essa ordem aberta pode ter a forma de uma sociedade desigual, uma sociedade democrática, ética, e com muita vontade de reinventar, recriar e requalificar os hiperindivíduos. Uma sociedade que saiba usar a filosofia para que possa pensar e repensar a realidade de forma crítica, analítica e reflexiva. Uma sociedade que até manipule, ideologicamente, os hiperindivíduos, mas que dê a eles a oportunidade de dialogar com os modelos de dominação existentes para que viver feliz na hipermodernidade.
Octavio Silvério de Souza Vieira Neto
Verão de 2009
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